Inflação no Brasil e o Tripé Macroeconômico

Braz Delpupo Neto
4 min readNov 30, 2021

Olá gente. Estamos vivendo um momento desgraçado de alta de preços e miséria e, para compreender melhor isso, eu decidi vim aqui falar sobre a questão inflacionária no Brasil. Tentei fazer isso da maneira mais didática o possível e espero que ajudem vocês a entender melhor a situação brasileira.

Para deixar melhor compreensível e menos complexo reduzirei minha explanação às 3 inflações que, provavelmente, você já deve ter ouvido falar em algum lugar.

Uma é a inflação de custos, que é caracterizada pelo aumento do preço da produção, que é repassada para o produto. Uma outra, a inflação estrutural, caracterizada pela falta de infraestrutura e políticas de um país que permitem as pessoas produzirem e escoarem a produção.

Uma boa explicação sobre como essas duas inflações agem sobre o país já desmentem um recente dizer do governo de que a inflação estaria aí por conta do auxílio emergencial. Isso seria a inflação por demanda que significa que as pessoas têm dinheiro para comprar os produtos e pagam cada vez mais. Essa explicação do governo oculta as duas outras inflações que atingem o país, além de ser uma grande imoralidade num país onde temos 125 milhões de pessoas em insegurança alimentar, e onde o auxílio emergencial nem conseguiu atender a todas pessoas que necessitavam.

A inflação de custos pode ser exemplificada quando o dólar sobe, e então acabamos por ter nossa gasolina, cotada em parte em dólar, acompanhando essa subida — pois não somos autossuficientes em gasolina e temos que importar. E como o Brasil depende de um sistema rodoviário para a distribuição de mercadorias, o frete aumenta com a alta do dólar e esse custo é passado para as mercadorias. Ou seja, houve um aumento dos custos das mercadorias.

A inflação estrutural atinge também o país pela falta de políticas de infraestrutura do Estado, como portos, ferrovias e políticas industriais, que acabam gerando desemprego, aumento de custos de mercadorias e impedem o mercado de escoar a produção e estabilizar a estrutura econômica necessária ao país. Soma-se a isso as privatizações que seguem uma lógica de lucro e terminam geralmente em monopólios e alta de tarifas no Brasil.

Acontece que, desde o governo FHC, só lidamos com inflação como sendo inflação de demanda por meio da política do tripé macroeconômico — a firmação do nosso pé no neoliberalismo — que fixa uma meta de inflação a ser atingida aumentando os juros, então impedindo que o dinheiro vá para a mão das pessoas — o que não soluciona o problema da inflação, pois ela não é de demanda. Se fosse só isso era para os bancos reclamarem, pois ao não emprestarem não teriam lucro, mas nós ainda enxugamos os caixas dos bancos com títulos da dívida pública — que rendem juros — pelo Banco Central (BC) com essa mesma justificação de impedir a inflação de demanda emergir, assegurando assim o lucro dos bancos. E o dinheiro enxugado pelo BC ainda é esterilizado, dado que seguimos nessa prática de impedir a todo custo a inflação de demanda.

Essa é uma razão dos juros altos no Brasil: para que emprestar se o caixa dos nossos bancos serão enxugados?

Então, por conta da meta inflação do tripé macroeconômico, aumentamos os juros para não emprestar, enxugamos o caixa dos bancos entregando títulos da dívida pública que somam 50% em média do nosso orçamento anual há vários anos já, e esterilizamos o dinheiro enxugado nos bancos com a mesma desculpa de inflação de demanda!

O nosso mercado financeiro estar calçado na dívida pública gera um efeito perverso somado à política do tripé macroeconômico: qualquer investimento que o Estado vá fazer, rapidamente gera uma grande instabilidade no mercado financeiro pois, no horizonte, há a chance de o Estado não conseguir “honrar a dívida”, não cumprir o pagamento dos juros, e então, o título da dívida, usado como moeda, passa a perder seu valor, perde sua confiança para ser usado como moeda — isso seria efeito de uma falta de responsabilidade fiscal, outro pilar do tripé macroeconômico. Então, por exemplo, vemos agora o próprio governo Bolsonaro entrando em desacordos internamente para dar R$400,00 para a população. Sendo que na verdade, essa instabilidade gerada no mercado é totalmente psicológica, não haveria nem inflação nem calote do governo na dívida por conta dessa política social. É preferível a estagnação econômica da vida dos brasileiros do que os títulos da dívida pública perderem a seu valor como moeda, liquidez. E nós, que não estamos envoltos dessa ideologia perversa de só fazer o dinheiro se acumular, conseguimos perceber o verdadeiro motivo pelo qual a dívida cresce — o enxugamento do caixa dos bancos.

Um dos efeitos de tomarmos a inflação como sendo só de demanda e essas políticas para contê-la, é entrarmos na situação de estagflação. Um recesso econômico acompanhado de inflação. Ou seja, temos essa situação estrutural e de custos ligados à inflação e a soma-se à alta de juros, que paralisa ainda mais a economia.

Falta, portanto, políticas que olhem dessa maneira mais abrangente para a inflação e que evitem, por exemplo, que fiquemos à mercê do preço do dólar no caso da gasolina e também dos commodities, que acabam ficando cotados em dólar para o consumo interno também, dado que são muito exportados. Além de uma política que se preocupe com a vida do brasileiro, uma economia que não opte pelo lucro de aplicadores a custo de previdência, saúde, educação, indústrias etc. Por exemplo, uma política para o agronegócio que busque alimentar nosso próprio país primeiro e depois exportar, por meio de silagens que regulem efetivamente o preço das mercadorias. Ou políticas que busquem estruturar o país pela indústria, portos e ferroviárias. Só que para a implementação dessas medidas é necessária uma força política para conseguir sair do neoliberalismo que privilegia o lucro dos banqueiros e acionistas em detrimento da população, que continua vendo a inflação só por uma ótica e combate ela por mecanismos perversos, e mantem uma forte austeridade fiscal, mantendo-se de maneira muito ortodoxa em relação ao tripé macroeconômico.

Esse pequeno artigo pode ser uma introdução, para saber mais, recomendo:

(1) A Era do Capital Improdutivo (2018) Ladislau Dowbor.

(2) https://www.youtube.com/watch?v=lVDO9aKHww0&ab_channel=RedeTVT

(3) Todo trabalho da Auditoria Cidadã da Dívida https://auditoriacidada.org.br/

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